sexta-feira, 16 de junho de 2017

UFF recebe: Quilombo do Camorim

No último dia 08 de junho, o Laboratório de História Oral e Imagem (LABHOI) do Departamento de História da Universidade Federal Fluminense (UFF) recebeu Adilson Almeida - presidente da Associação Cultural Quilombo do Camorim (ACUQCA), para a realização de uma entrevista sobre a história da comunidade e sua inserção no movimento quilombola.

Foto: Nathália Sarro - 08 de junho de 2017

A atividade faz parte de uma das etapas do meu projeto de pós-doutorado financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (FAPERJ). Um dos objetivos é montar um acervo de entrevistas realizadas com lideranças quilombolas do estado do Rio de Janeiro. Atualmente temos: 36 comunidades remanescentes de quilombo certificadas pela Fundação Cultural Palmares, 7 comunidades aguardando análise técnica do processo, 1 comunidade aguardando visita técnica da instituição e mais 6 que foram identificadas, mas que nunca abriram processo pedindo a certificação. Ou seja, um total de 50 quilombos! 

Adilson foi acompanhado de Adriana Lopes, secretária da ACUQCA. A entrevista durou aproximadamente 2h e meia e contou com a colaboração de Raquel Terto e Nathália Sarro (ambas do LABHOI) para filmagem e som. Ele nos contou sobre sua infância no Camorim ao lado de sua avó, falou sobre a Capela de São Gonçalo do Amarante – construída no século XVII e tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1965, lembramos do ano de 2005 – quando ele buscava informações em KOINONIA sobre como certificar um território quilombola e destacou a magia e o encanto do Parque Estadual da Pedra Branca – Decreto 2377 de 28 de junho de 1974, uma das maiores florestas urbanas do mundo.

Sobre a titulação do território através do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), Adilson nos contou que solicitou a abertura do processo em 2004. Em junho de 2013, a área foi certificada pela Fundação Cultural Palmares como remanescente de quilombo (processo: 01420.007233/2013-88). Porém, apesar da certificação – necessária para a titulação do território já que trata da autodeclaração da comunidade, ainda em 2013 a comunidade recebeu uma carta do INCRA informando que a área reivindicada não correspondia a um território quilombola e o processo foi arquivado.

Logo em seguida, também no ano de 2013, uma construtora (Cyrela) comprou o mesmo território e deu início as obras do Barra Media Village 3 (Vila da Mídia 3), local onde os jornalistas do mundo inteiro ficaram hospedados na ocasião dos Jogos Olímpicos Rio 2016. Diante da mobilização da comunidade, a construtora doou uma parte do terreno para a Prefeitura, é essa área – onde existe um cemitério de escravos, que os quilombolas buscam titular e construir uma sede para a associação. Para isso é necessário a reabertura do processo no INCRA. 

Atualmente, a arqueóloga Silvia Peixoto (Museu Nacional - UFRJ) realiza pesquisa de doutorado sobre a ocupação histórica de Jacarepaguá e está escavando a região que corresponde ao Engenho de Camorim. Para saber mais sobre o projeto, indicamos o vídeo: Arqueologia em EscavAção #1.

A ACUQCA desenvolve o Projeto Sankofa em parceria com o Instituto Rio e o Instituto PHI que oferece oficinas de jongo, coco de roda, samba de roda e capoeira aberta a população em geral. Com a ONG Argilando e o Instituto Estadual do Ambiente (INEA), promovem o reflorestamento no açude do Camorim. 

Agora, se você quer fazer uma trilha no Parque Estadual da Pedra Branca e aprender mais sobre a história dos quilombolas do Camorim, é só agendar com o Adilson uma visita. Em janeiro desse ano eu fiz, garanto que vale muito a pena conhecer a capela de São Gonçalo do Amarante, a casa do alemão, o açude e a cachoeira maravilhosa!


Foto: Daniela Yabeta - 07 de janeiro de 2017

Contato ACUQCA: Adilson Almeida – e-mail: acucacamorim@gmail.com – Endereço: Estrada do Camorim, 925. Telefone: (21) 98320-2634. Facebook: ACUCA CAMORIM


Daniela Yabeta
Historiadora/ Pós-Doc em História (UFF-FAPERJ)
Organizadora do Atlas Quilombola 


sábado, 10 de junho de 2017

Manifesto em apoio ao quilombo de Acauã (RN)

Para encerrar a semana, pedimos a todos/todas que assinem a petição pública em apoio à comunidade quilombola de Acauã, localizada no município de Poço Branco - Rio Grande do Norte. 

Acauã foi certificada como remanescente de quilombo pela Fundação Cultural Palmares em setembro de 2004 (processo: 01420.000603/2004-65) e hoje luta pela garantia de seu território no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA). 

Parte das terras reivindicadas pela comunidade inclui uma área da Fazenda Boa Esperança, que em 2008, foi desapropriada por interesse social. Acontece que seus proprietários questionaram o valor da indenização e a própria constitucionalidade do Decreto 4887 de 20 de novembro de 2003. Sendo assim, impetraram uma ação judicial pedindo a revogação da titulação do quilombo de Acauã. 

O processo já foi julgado em primeira instância, com vitória dos quilombolas, mas os latifundiários mantiveram a ação recorrendo ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região. O julgamento está previsto para 21 de junho. 

Vale a pena lembrar que, ao questionarem a constitucionalidade do referido Decreto, o julgamento não terá apenas efeitos para o quilombo de Acauã. A decisão atingirá também as comunidades quilombolas de todo o país. 

Para conhecer a história da comunidade, leia a dissertação de Alberto Gutiérrez Arguedas: "Território para viver", do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). 

Aproveitamos também para publicar o manifesto que será enviado ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região:



Manifestamos nosso apoio à Comunidade de Acauã-RN nos autos da Arguição de Inconstitucionalidade nº 0009091-41.2012.4.05.8400/01, que deverá ser julgada por este E. Tribunal Regional Federal na data de 21 de junho de 2017, quando então se discutirá a constitucionalidade do Decreto Federal 4.887/03. 

A maior parte das famílias da comunidade quilombola de Acauã foi atingida pela construção da barragem de Poço Branco, iniciada no fim da década de 1950 e completada em 1969. A antiga cidade de Poço Branco foi inundada, bem como os povoados e comunidades rurais situadas à beira do rio, dentre eles a antiga Acauã. Suas famílias foram removidas e passaram a residir em novos lugares, como a atual localização da comunidade quilombola Acauã. Segundo a história oral, aquela área teria sido descoberta no passado por José Acauã, um escravo fugido de outras terras. As versões deste momento originário envolvem a chegada dos antepassados das atuais famílias de Acauã, que iniciaram no local uma rede de relações de parentesco e de aliança. 

Acauã foi certificada pela Fundação Cultural Palmares como comunidade remanescente de quilombo em 2004, e desde então luta pelo reconhecimento do seu direito constitucional à propriedade definitiva da área em que se encontra e pela implementação de políticas públicas para o seu povo. 

Em um contexto mais amplo, apenas após séculos de opressão física, social e moral a Constituição Federal de 1988, em sua integralidade, inaugurou um processo histórico de retirada das comunidades quilombolas de uma situação de invisibilidade jurídica, econômica, social e política. Contudo, as conquistas obtidas pelas comunidades quilombolas podem sofrer graves retrocessos se esta E. Corte não confirmar a constitucionalidade do Decreto Federal 4.887/03. 

A eventual declaração de inconstitucionalidade violará o texto constitucional por omissão, na medida em que a Constituição, que cria direitos de acesso à terra para quilombolas, ficará amortecida e amordaçada. Assim, coloca-se a esta Corte a missão histórica de não impedir que o Poder Executivo efetive o direito constitucional dos remanescentes de quilombo. 

Nesse sentido, se espera que este E. Tribunal possa fazer prevalecer a primazia da Constituição, muitas vezes vulnerada e desrespeitada por inadmissíveis omissões dos poderes públicos. A declaração de constitucionalidade do Decreto Federal 4.887/03 pelo Poder Judiciário é necessária, pois o Poder Executivo não está a omitir ou retardar a aplicação do direito, muito ao contrário, dá efetividade e aplicação concreta ao artigo 68 do ADCT da Constituição Federal. 

As disputas quanto ao conceito de remanescente de quilombo e quanto à extensão dos direitos territoriais quilombolas se resolvem em nível constitucional, pela natureza de direito fundamental que a norma apresenta. Quando a Constituição garantiu aos remanescentes das comunidades de quilombos o título das terras que ocupam, tutelou o legislador o direito ao trabalho, à preservação da cultura, dos costumes e tradições dessas comunidades. 

Logo, não há relevância jurídica em positivar constitucionalmente um direito de acesso à terra sem que este se efetive e desempenhe sua função precípua para as comunidades e para a sociedade brasileira. De nada adiantaria titular uma área ínfima, que não se preste à manutenção de uma comunidade rural que sobrevive do trabalho com a terra, que não garanta minimamente o desenvolvimento das relações culturais e sociais de cada grupo. Assim, o único sentido prático viável de ser aplicado ao art. 68 do ADCT da CF, quanto à sua extensão, está ligado à titulação das terras que tradicionalmente são ou foram utilizadas por remanescentes das comunidades de quilombos para manutenção da vida. 

Ademais, o Decreto Federal 4.887/2003 não utiliza única e exclusivamente o critério da auto-atribuição para que se definam, em procedimento administrativo específico, se os pleiteantes são beneficiários do direito previsto a Constituição. Do ponto de vista jurídico e antropológico, a auto-atribuição é um dos requisitos essenciais para que, em cada caso, a administração possa averiguar se os pleiteantes devem ser beneficiários do direito previsto no art. 68 do ADCT da CF. Frise-se que as comunidades de quilombos repudiam a classificação e a conceituação que a história oficial lhes impôs. Para as comunidades os quilombos não são espaços de negros fugidos, mas espaços de luta e resistência à opressão histórica de séculos de escravidão, preconceito e racismo, como é o caso da comunidade quilombola Acauã. 

Por fim, a Ação Direta de Inconstitucionalidade 3239 no Supremo Tribunal Federal, que tem por objetivo justamente a declaração de inconstitucionalidade do Decreto Federal 4.887/03, teve seu julgamento iniciado no ano de 2012, e atualmente está empatada com um voto pela inconstitucionalidade, proferido pelo Ministro Cesar Peluso, e outro pela constitucionalidade, voto proferido pela Ministra Rosa Weber. 

Nesse sentido, requeremos a Vossas Exas., com todo respeito, que julguem pela constitucionalidade nos autos da Arguição de Inconstitucionalidade nº 0009091-41.2012.4.05.8400/01, mantendo o Decreto Federal 4.887/03 na sua integralidade, pois apenas assim as comunidades quilombolas de todo o Brasil poderão continuar a avançar no processo histórico de afirmação e conquista de direito humanos. 


Daniela Yabeta
Historiadora - Pós-Doc em História (UFF-FAPERJ)
Editora da Revista do Observatório Quilombola

Encontro de Comunidades Quilombolas do Rio de Janeiro

Entre os dias 10-12 de agosto, estive em mais um Encontro das Comunidades Quilombolas do Estado do Rio de Janeiro. Este foi o quinto encont...