Hoje vamos contar mais um
capítulo da história de Maria Cândida dos Santos, conhecida como Dona Dandinha
- a matriarca quilombola de Pitanga dos Palmares. Vocês conheceram a história
dela no texto publicado por Daniela Yabeta no último dia 03 de abril. Para
relembrar, basta clicar aqui.
Dona Dandinha foi
diagnosticada com DPOC
– Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, o que torna sua respiração muito difícil.
Além do oxigênio, fornecido pelo SUS – Sistema Único de Saúde, ela também
necessitava de uma cadeira de rodas para melhorar sua qualidade de vida.
Ficamos sabendo da
necessidade da cadeira de rodas no mês de março, através de uma mensagem do
Flávio Pacífico, presidente da Associação Quilombola de Pitanga dos Palmares. A
partir daí, iniciamos a campanha através de uma vaquinha
online. Foi um sucesso!
No dia 18 de maio, uma quinta-feira
chuvosa em Salvador, sai do bairro da Federação, onde moro, com a missão de
concretizar uma ação coletiva, que contou a participação de colaboradores de diversas localidades.
A caravana foi composta por
três pessoas: eu, a jornalista Ivana Flores (que aceitou a missão de fazer as
imagens) e Carlos, nosso uberista de
fé. Seguimos rumo a comunidade
quilombola de Pitanga do Palmares, localizada em Simões Filho, região
metropolitana de Salvador, para entregarmos a cadeira de rodas.
Embora o quilombo seja
relativamente próximo a Salvador, eu não conhecia nada do lugar, então, fomos
de coração aberto para tudo. Durante a viagem de pouco mais de uma hora,
falamos sobre a urbanização, os desafios de morar nas proximidades de rodovias,
conjecturamos sobre como seria a configuração comunitária, e principalmente, em
como seria a reação de Dona Dandinha com a entrega de seu presente.
Foi então que descobri que Pitanga dos
Palmares é cortada por uma rodovia, que como todos nós sabemos ou podemos
imaginar, produz um impacto muito maior do que é visível. Sempre que isso
acontece, é fundamental reforçar as conexões históricas, culturais e sociais
que mantem a identidade coletiva do grupo.
Além da rodovia, encontramos
algo que, nestes meus quase 15 anos de andanças por comunidades quilombolas,
nunca encontrei: um
presídio que foi construindo em 2002 nas terras da comunidade.
Como isso é possível? Que
tipo de governo constrói um presídio numa área coletiva de preservação de modo
de vida diferenciado? Quais impactos isso leva a vida dos quilombolas? E das
mulheres? Mil questões passaram pela minha cabeça.
E aí, chegamos na Capela de
São Gonçalo, casinhas coloridas e muitas árvores! Conhecemos o Flávio Pacífico
e ele nos levou até uma linda casinha, onde na varanda, sentada numa cadeirinha
estava ela, Dona Dandinha, que nos recebeu com um sorriso aberto!
Casa Dona Dandinha - Foto: Ivana Flores
Foi difícil segurar e emoção
de ouvir: “Oi, minha filha! ”. Com a voz falhada, a matriarca da comunidade estava
à espera do carinho que veio de longe. Me senti com muitos braços, pois eu a
estava abraçando por todas as pessoas que de longe, se solidarizaram com a
situação de vulnerabilidade dela.
Ana Gualberto e Dona Dandinha - Foto: Ivana Flores
Mas vamos a outras coisas
que rapidamente soubemos durante a visita à comunidade e através de nossa
conversa com o Flávio.
Existe a casa do samba! Que
é o memorial da cultura da comunidade. Lá é onde guardam os instrumentos do
samba de viola, do qual ele hoje é o violeiro. Guardam também o Boi do Bumba
Meu Boi.
Memorial de Cultura - Foto: Ivana Flores
A comunidade é devota de São
Gonçalo e adivinhem quem é a principal devota? Ela mesma: Dona Dandinha! Mesmo
doente ele ainda pede para que seus familiares e cuidadores ascendam velas para
São Gonçalo, São Jorge e outros santos de sua devoção.
Guardam também o presépio e
as palhas de são
gonçalinho que é uma planta de grande prestígio dentro dos terreiros de
candomblé de nação Ketu, pois está ligado ao orixá Oxossi. Esta planta é usada
em uma festividade chamada “Queima da palhinha” que acontece de dezembro a
janeiro.
Flávio Pacífico e o presépio - Foto: Ivana Flores
Na comunidade também existe (e
resiste) um Ilê Axé, mesmo com a chegada de muitas igrejas. Segundo Flavio, hoje
são 14 igrejas evangélicas diretamente em contato com a comunidade.
Falamos também sobre as
lutas do quilombo e sobre as relações com o governo estadual da Bahia, que tem
apoiado algumas ações, principalmente no que se refere a produção agrícola e
comercialização. Quanto ao governo municipal, de acordo com os quilombolas, ignoram
a existência da comunidade.
Foi uma visita rápida que
deixou aquele gostinho de quero mais! E claro, assim que eu souber mais coisas
sobre a comunidade, vou compartilhar com vocês.
Por hoje gostaria de registrar
o momento de amor que vivenciei através da ação de muitas pessoas. Sintam os
beijos e o sorriso de Dona Dandinha, além de meu sentimento de esperança e
gratidão!!!!
Ana Gualberto
Historiadora - Metranda Cultura e Sociedade UFBA
Editora do Observatório Quilombola
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