sexta-feira, 19 de maio de 2017

Revisitando o Informativo Territórios Negros – O quilombo de Conceição do Macacoari (AP) e a suspensão das titulações quilombolas

Para o caderno de campo dessa semana, resolvi revisitar o Informativo Territórios Negros de KOINONIA e trazer o segundo texto que publiquei na coluna “Um Território”, no início do ano de 2006.

Eu já expliquei que, naquela época, não era costume assinar nossos textos. Os créditos vinham apenas no final da revista, organizado de forma geral. Portanto, se vocês procurarem , não encontrarão meu nome.

Nos últimos meses estou tentando revisar esse material e disponibilizá-lo aqui no blog e também no Atlas Observatório Quilombola. Já fiz isso com o texto sobre a comunidade remanescente de quilombo de Barro Preto, localizada no município de Santa Maria do Itabira (MG). Agora chegou a vez do quilombo de Conceição de Macacoari, localizado a 100km de distância do centro da cidade de Macapá (AP). 

A comunidade de Conceição do Macacori foi certificada pela Fundação Cultural Palmares em 2005 - processo 01420.002182/2005-98, e titulada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária em janeiro de 2006 - processo 54350.000393/2005-23.


Conceição do Macacoari tem esse nome por dois motivos. O primeiro é em homenagem a Nossa Senhora da Conceição, padroeira da comunidade, festejada em 08 de dezembro. O segundo é por conta da grande quantidade de macacos que habitam a região.


De acordo com o Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) elaborado pelo Incra, os antigos moradores contam que a história da ocupação do território remete ao século 19.

Foi nessa época que o liberto Manoel Neri, conhecido como Pai Mané, foi levado de Mazagão Velho (interior do Amapá) para combater na Guerra do Paraguai (1864-1870).

Acontece que durante o caminho, ele conseguiu fugir até instalar-se definitivamente na região que hoje corresponde ao quilombo.

Mais tarde, já no início do século XX, as terras de Conceição do Macacoari foram vendidas para o pecuarista negro Estevão Picanço, cujos descendentes continuam vivendo no mesmo território.


A decisão da comunidade de buscar a certificação e a titulação do território como remanescente de quilombo foi intensificada quando agricultores da região, passaram a pressionar o grupo para que eles vendessem suas terras e deixassem a localidade.

Diante da ameaça, os moradores de Conceição do Macacoari resgataram a história de constituição da comunidade relacionada a experiência da escravidão e do pós-abolição e se organizaram em torno da Associação de Moradores da Comunidade Quilombola de Conceição do Macacoari (AMCQCM).

O processo da preparação da documentação e a organização da associação durou cerca de um ano. Na época os quilombolas contaram com o apoio da (hoje extinta) Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir).

Depois disso, procuraram a Superintendência Regional do Incra no Amapá, onde foram orientados sobre os procedimentos para a titulação do território.

Atualmente, a realidade dos processos de titulação sofreu um impacto muito grande. Pela primeira vez, desde 1995, o governo federal suspendeu as titulações quilombolas.

A suspensão será mantida até que o Superior Tribunal Federal (STF) conclua o julgamento da ADI 3239 que considera inconstitucional do Decreto 4887 de 20 de novembro de 2003, responsável por regulamentar o procedimento de identificação, reconhecimento, delimitação, demarcação e titulação das terras ocupadas por remanescentes de quilombos de que trata o Artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal de 1988.

Dez anos depois que escrevi o texto sobre Conceição do Macacoari, jamais poderia imaginar que a possibilidade da garantia do território quilombola fosse se transformar na incerteza de mais de 1.500 comunidades que foram diretamente afetadas por essa decisão. 

Seguimos na luta!

Daniela Yabeta
Historiadora - Pesquisador Pós-Doc (FAPERJ - UFF)
Editora da Revista do Observatório Quilombola 


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